No contributo para a história do minibásquete em Portugal, que tenho vindo a publicar, talvez este seja o capítulo, face à minha relação familiar e pessoal com o Prof. Mário Lemos, mais difícil de escrever.
O Prof Mário Lemos para além de ser meu tio por afinidade, (era casado com a professora de educação física Lídia San Payo de Lemos irmã da minha mãe), foi o meu primeiro treinador e foi de muito perto que o acompanhei na organização dos famosos Convívios de Minibásquete, organizados do início dos anos 70 pelo Colégio Militar e pela Escola Preparatória Francisco de Arruda.
Estes convívios que movimentavam muitos minis, nas instalações do Colégio Militar, na Escola Francisco de Arruda e no Pavilhão da Ajuda, foram alvo de uma grande reportagem, dirigida pelo jornalista Jorge Schnitzer no jornal a Bola de 25 de maio de 1972, onde o Prof. Mário Lemos falava dum dos seus grandes sonhos. O título dessa grande reportagem era “O MILAGRE DO MINIBASQUETE – A ESCOLA NA RUA À PROCURA DE 40.000 CRIANÇAS.”
Infelizmente, esse objetivo e desígnio para o minibásquete está passados mais de 50 anos, muito longe de ser alcançado.
Nessa reportagem está expressa muito da sua filosofia e doutrina, nomeadamente a possibilidade de existirem equipas mistas e a sua famosa citação quando se dirigiu a Jorge Schnitzer e disse: “Escreva minibasquete e não minibasquetebol. Minibasquete quer significar precisamente que este jogo é uma coisa e basquetebol é outra.” (1)
Falar destes Convívios e não mencionar o saudoso e muito esquecido Prof. João Coutinho é de total injustiça. Ninguém faz nada sozinho e o Prof. João Coutinho, que os mais velhos certamente se lembrarão pelo menos como comentador do basquetebol na RTP, era o responsável pelas atividades que decorreram na Escola Francisco de Arruda.
Embora já fosse praticado em Moçambique, desde 1964, na cidade da Beira por influência do dirigente e grande entusiasta Cremildo Pereira, a primeira a primeira apresentação pública do jogo, decorreu por iniciativa do Prof. Mário Lemos em Junho de 1966 no Colégio Militar conforme noticiado no Diário de Lisboa em publicação em anexo.
Essa apresentação foi dirigida pelo então professor estagiário Carlos Gonçalves, que anos mais tarde já depois do falecimento do Prof. Mário Lemos escreveu numa evocação a Mário Lemos as seguintes palavras que sintetizam muito da sua doutrina e filosofia:
“Se há homens que contribuíram de forma significativa para a valorização do basquetebol português, o professor Mário Lemos tem sem dúvida juz a essa designação.” (…) A sua atividade docente distribui-se principalmente pela Escola Industrial Machado Castro, Colégio Militar e Escola Preparatória Francisco de Arruda, em todas elas sendo o responsável pela iniciação de muitas centenas de jovens na prática do basquetebol. (…) A partir de 1966 o professor tornou-se no grande animador do minibasquete em Portugal. Estudioso do jogo, após a realização de vários torneios internos no Colégio Militar organiza em junho desse ano a primeira demonstração pública em território metropolitano. (…) Compreendendo a essência do jogo e definindo claramente os seus objetivos (bem para além dum simples movimento de iniciação ao basquetebol) torna-se no grande doutrinador do jogo. (…) A sua visão educativa do jogo leva-o a introduzir conceitos inovadores, como a constituição de equipas mistas (crianças de ambos os sexos dos 8 aos 10 anos) e à organização de vários torneios-convívios com a participação de equipas constituídas por crianças oriundas de diferentes equipas. Conceitos que viriam a ter conhecimento internacional e que estão integrados na organização dos jamborees internacionais de minibásquete." (2)
As palavras têm peso ciente desse facto o Professor Mário Lemos nunca utilizava o conceito, hoje em dia tão utilizado de Concentração de Minibásquete. Ele preferiu sempre o conceito de Convívio de Minibásquete. Não era uma questão de concentrar muitas crianças, era o princípio e pô-las a conviver.
Estes conceitos, nomeadamente a possibilidade de entre os mais novos se poderem constituir equipas mistas são no final dos anos 60 princípios dos anos 70 uma verdadeira “pedrada no charco”. Conceitos de tal maneira inovadores, que é com naturalidade, que passa a desempenhar, primeiramente funções no Comité Internacional do Minibásquete, e posteriormente na Comissão de Juventude da FIBA, sendo certamente dos primeiros portugueses a ter integração na FIBA.
Infelizmente, conhecer o pensamento do professor Mário Lemos, (porque, ao contrário de outros grandes pensadores do jogo, como os Professores José Esteves e Teotónio de Lima e Hermínio Barreto, mencionado apenas os infelizmente já falecidos), deixou pouca bibliografia, implica trabalho de muita investigação, nomeadamente dos seus artigos publicados em vários jornais, nomeadamente no jornal o Século. Penso que na biblioteca do FMH também existem alguns documentos com a colaboração dos seus alunos em que o minibásquete não é identificado como desporto para os mais jovens, mas desporto dos mais jovens.
(1) Schnitzer, Jorge - A Bola 25 de Maio 1972
(2) Gonçalves, Carlos Alberto - Evocação do Prof. Mário Lemos